sábado, 29 de abril de 2017

FÁTIMA - Uma palavra que faço minha

Na impossibilidade de dizer melhor, faço minhas as palavras deste teólogo e filósofo, para falar do fenómeno e realidade de Fátima, dada a proximidade do centenário das Aparições. AH


O que eu penso sobre Fátima (1)

Anselmo Borges

Antes de entrar no tema propriamente dito, quero deixar três notas prévias, que devo ao leitor. A primeira, para dizer que, a pedido da revista internacional Concilium, escrevi, de modo mais organizado, um texto sobre Fátima, a publicar no mês de Junho. A segunda, mais importante, para esclarecer que fui ordenado padre em Fátima pelo cardeal Cerejeira e que, sempre que lá vou para fazer conferências, passo pela Capelinha das Aparições e ali rezo como tantos outros. Depois, à pergunta se vou a Fátima por causa da vinda do Papa respondo que não, porque não gosto de confusões e penso que os responsáveis da Igreja deveriam prevenir as pessoas, pois correm o risco de uma imensa desilusão, já que muitas dificilmente verão o Papa. Prestado este preâmbulo, o tema.
1. Deve ficar claro, desde o princípio, que Fátima não é dogma de fé. Que é que isto significa? Que se pode ser bom católico e não acreditar em Fátima. Fátima não faz parte do Credo. Outro esclarecimento mais urgente ainda: Fátima não ocupa nem pode ocupar o centro do cristianismo, o centro é Jesus de Nazaré, confessado como o Cristo, portanto, Jesus Cristo, e o Deus de Jesus e as pessoas, todas.
Aí está a razão por que, como disse a João Céu e Silva para o seu belo livro sobre Fátima, Fátima. A Profecia Que Assusta o Vaticano, eu trouxe a Portugal grandes teólogos, para congressos e colóquios, e não manifestaram interesse em ir a Fátima. De facto, Fátima não é propriamente uma questão teológica, é sobretudo uma questão de religiosidade popular. De imenso significado e que deve ser respeitada, sem dúvida alguma.
2. Para surpresa de alguns, confesso que não me custa admitir que as três crianças, os pastorinhos, tenham feito uma verdadeira experiência religiosa em Fátima.
Qualquer pessoa minimamente atenta, quer queira quer não, acaba por perceber que há um mistério no mundo. Fernando Pessoa dizia: olha para o lado e o mistério está lá (cito de cor), mas eu digo mais: ele está ao lado, em cima, em baixo, dentro, fora, em toda a parte. E todos somos confrontados com esse enigma e mistério e perguntamos: o que é isto?, qual é o fundamento de tudo?, qual é o sentido da existência?, para quê tudo? Crente é aquele, aquela, que se entrega confiadamente ao Mistério, ao Sagrado, esperando dele sentido, sentido último, salvação. Escusado será dizer que essa experiência e essa resposta confiada de fé surgem sempre interpretadas num determinado contexto existencial, pessoal, social, histórico, no quadro de pressupostos e expectativas, e na e pela sua mediação também.
3. As crianças também podem fazer uma experiência religiosa. E isso, repito, pode ter acontecido também em Fátima com aquelas crianças, os três pastorinhos. De facto, não consta que tenham sido pagas para dizer que viram Nossa Senhora; pelo contrário, até sofreram bastante. A própria Igreja, no começo, pôs muitas reticências.
Mas, acrescento, foi uma experiência religiosa, evidentemente, à maneira de crianças e no contexto histórico da altura: havia perseguição religiosa da Igreja por parte da Primeira República, estava-se em guerra (as crianças devem ter ouvido falar sobre a I Guerra Mundial e de como os soldados partiam para a guerra), e vivia-se no enquadramento religioso da época, que implicava as chamadas missões populares, com pregadores "missionários" que vinham de fora e, do alto dos púlpitos, aterrorizavam os fiéis com sermões de temor de Deus e terror do inferno. As crianças ouviam estas coisas na igreja e em casa.
Assim, tratou-se de uma experiência religiosa à maneira de crianças e segundo esquemas e uma imagética hermenêutico-interpretativa situada no seu contexto. Não se pode esquecer que a experiência religiosa se dá sempre dentro de uma interpretação, de tal modo que há experiências religiosas melhores e piores ou menos boas. A daquelas crianças não foi das melhores, pois pode-se, por exemplo, perguntar: que mãe mostraria o inferno a crianças de 10, 9 e 7 anos? Os pastorinhos ficaram marcados negativamente e, de algum modo, com a vida tolhida. Ao mesmo tempo, e isso é admirável, tiveram uma imensa generosidade face à situação que viviam.
Acrescente-se que aquele núcleo de experiência foi sendo submetido a arranjos e rearranjos ao longo do tempo, segundo novos esquemas interpretativos, no contexto de novas situações históricas e novos desenvolvimentos.
4. Perguntam-me: e eles viram mesmo Nossa Senhora? Maria, a mãe de Jesus, apareceu mesmo?
Aqui, é decisivo fazer uma distinção essencial. Entre aparições e visões. Uma aparição é objectiva, como, quando, por exemplo, estamos a conversar com uma pessoa e chega uma outra pessoa: os dois vemos a terceira pessoa que chega; se estivéssemos quatro ou cinco pessoas, seríamos quatro ou cinco a ver e a constatar a chegada objectiva desta outra pessoa. Evidentemente, não foi isso que aconteceu em Fátima e, neste sentido, é claro que Nossa Senhora não apareceu em Fátima aos pastorinhos. Se fosse uma aparição, todos os presentes veriam e constatariam a sua presença, o que não aconteceu nem podia acontecer, pois Maria não tem um corpo físico que possa mostrar-se empiricamente.
Tudo o que é espiritual é da ordem espiritual. Por exemplo, na Anunciação, não apareceu empírico-objectivamente nenhum anjo a falar com Maria. O que ela teve foi uma experiência místico-religiosa interior. Isso é uma visão, no sentido técnico da palavra: uma percepção interior. As grandes experiências são interiores e vão para lá do empírico. Afinal, a objectividade empírica não detém o monopólio de toda a realidade, da realidade mais verdadeira. (Continuaremos).

Padre e professor de Filosofia


segunda-feira, 17 de abril de 2017

PÁSCOA, VIDA, RENOVAÇÃO

Olha o meu caderno de apontamentos como está esquecido!...

Isto é um modo de pensar errado, pois sabes muito bem que todos os dias penso em ti. Só que, por vezes, a vida não estica o suficiente para poder chegar até ao caderno... Mas nem é bem isto. As razões ainda são outras: escrever neste caderninho obriga-me a concentrar-me, a pensar mais fundo, fugir do rebuliço do dia-a-dia em que andamos enredados...
E ainda há semanas em que os afazeres diários são ainda sobrecarregados com outros afazeres. E para umas coisas andarem, outras ficam paradas...
Como diz a Prazeres, «desde que vieste da Madeira, nada mais aconteceu...». Qual quê! Aconteceram muitas coisas... O António não pára ainda. A vida continua a chamar por mim, quer nas acções em que sou o primeiro beneficiado, quer quando são os outros que beneficiam dos meus préstimos.
Este blogue pára quando a vida em família me obriga a gastar o tempo nas trivialidades necessárias para o decurso normal dos dias. Também fica parado quando não posso voltar-me para dentro, reflectir, reunir ideias com algum interesse público. E desta vez, já está parado há um mês...
Hoje apeteceu-me dizer umas coisas. Sobretudo, celebrar a Vida! E há razões para isso...
No ciclo do tempo, acabamos de celebrar a passagem da morte para a ressurreição de Cristo e consequentemente também da nossa. Na curta viagem pelo Cadaval, passeando entre vegetação ricamente florida, vieram-me algumas vezes ao pensamento a maravilha da criação, o milagre anual da primavera, a beleza do que estava a ver. E depois pensava: como é que tudo isto acontece? Quem criou e quem coordena todo este mundo misterioso?
Li há dias que as pessoas pensam mais no mistério da morte, do fim da vida, em vez de pensaram mais no princípio de tudo, em como tudo se desenvolve a partir de simples sementes, naqueles momentos em que a fragilidade, a inconsistência dos seres faz de todos eles uns entes dependentes, longe de toda aquela energia e jactância pessoal que mais tarde apregoamos. Estou a pensar mais em quem diz que é senhor da sua vida, que faz dela o que quiser e até é livre para acabar com ela. É um absurdo passar-se a proprietário de um dom que gratuitamente lhe foi doado. Devemos antes sentir-nos agradecidos e gerir os dias de modo a deixarmos um rasto de beleza e bondade...
Outro pensamento que me tem dominado é esta realidade histórico-religiosa da última semana, em que um Cristo, Homem-Deus, depois de deixar aos discípulos uma mensagem de vida que perturbou o pensamento dominante e valorou o amor dos outros, a vida simples e verdadeira em consciência, é arrastado para a condenação à morte por pressão dos poderes dominantes da época.
Na liturgia da festa da Páscoa, as leituras da noite chegam a dizer algo que dá para pensar: mais maravilhoso que o milagre da criação é o milagre da morte e ressurreição de Cristo. Em que penso eu quando refiro esta ideia?
- Penso na maravilha da presença de Deus no meio de nós e na força espiritual que Ele iniciou há dois mil anos. Penso na iluminação sobre as nossas vidas que Jesus nos ofereceu com os acontecimentos da Páscoa e também na perspectiva de vida que a sua doutrina nos oferece. Penso ainda na fragilidade inicial com que começou este movimento comunitário (discípulos a renegar o mestre, sem entenderem os acontecimentos, o que me diz que, se a Igreja não é sobretudo obra de Deus, não tem justificação humana toda esta vivência actual que arrasta milhões no mundo inteiro. E se a Igreja tem muito de errado, mais ela mostra de belo e luminoso a partir do seu pastor maior, o Papa Francisco.
Sem ti, Senhor, para onde podemos ir?

António Henriques

sábado, 15 de abril de 2017

PÁSCOA - A FESTA DAS FESTAS

Hoje, faço minhas as palavras sábias e profundas do Sr. D. Antonino
Dias, bispo de Portalegre e Castelo Branco.


PÁSCOA - A FESTA DAS FESTAS

Celebramos a Páscoa, a festa por excelência dos cristãos, a Festa das festas, a Ressurreição do Senhor. 
Para nós, os crentes, a Ressurreição de Cristo é o fundamento da nossa fé e vence a cultura da morte, do ódio, da tristeza, do vazio, da indiferença, da vida sem sentido. É a proclamação dos valores mais altos da conduta humana, é a vitória do primeiro e principal valor humano: a Vida. A Páscoa proclama a Boa Nova da Salvação, faz-nos sentir amados e perdoados por Deus rico em misericórdia, desafia-nos a abrir as portas do coração a Cristo Redentor que se deu por amor e constantemente se faz encontrado, convida-nos a reavivar o dom que está em nós, o dom do nosso batismo pelo qual mergulhamos na morte com Cristo e com Ele ressuscitamos para uma vida nova. Como filhos adotivos do Pai, membros de Cristo, templos do Espírito Santo e membros da Igreja, temos a feliz missão de sermos fermento, sal e luz no meio da comunidade humana, vivendo com alegria e esperança, fomentando a cultura do Amor: “Este é o meu mandamento: amai-vos uns aos outros como eu vos amei. Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos. Vós sois meus amigos se praticardes o que vos mando (…) Isto vos mando: amai-vos uns aos outros” (Jo 15, 12-14.17)


UM HINO DO OFÍCIO DAS HORAS
“Um novo coração me dá, Senhor,
O qual a Ti só tema, a Ti só ame,
A Ti, meu Deus, meu Pai, meu Redentor.

Por Ti suspire sempre, por Ti chame,
Por Ti me negue a mim e tudo negue,
Por Ti saudosas lágrimas derrame.

A Ti busque, a Ti ache, a Ti me entregue
Com tão intenso amor, com tal vontade
Que nunca mais de Ti me desapegue.

Ó bom Jesus, por Tua piedade,
Não Te escondas de mim, isto Te peço,
Que sem Ti tudo enfim é só vaidade.

Muito pedi, Senhor, pouco mereço,
Tão pouco que Te não mereço nada,
Se o Teu muito ao meu nada não dá preço.

Esta alma tantas vezes desviada
Do caminho do Céu, Tu encaminha,
Que, se por Ti não vai, vai muito errada,
Doce Jesus, doce esperança minha.”

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Feliz Páscoa para todos, com muita alegria e paz.

Antonino Dias
14-04-2017